No dia 31 de outubro de 2024, terminou um dos julgamentos mais esperados no Brasil nos últimos anos, quando foram levados ao crivo do júri popular dois acusados pela morte da vereadora Marielle Franco e de seu motorista, Anderson Gomes, ocorrida em 2018, no Rio de Janeiro (RJ). Além de uma pesada sentença, em anos de reclusão, para os dois policiais condenados pelo atentado, chamou a atenção uma outra punição determinada: a indenização aos familiares das vítimas, no valor total de R$ 3,5 milhões. 

Como novembro é o “Mês do Júri”, o Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS) aproveita esse fato recente para explicar que essa é uma das formas de fazer justiça por meio do Tribunal do Júri.

“A vida humana é inestimável e, por isso, a reparação financeira busca amenizar o impacto da perda”, define o Promotor de Justiça José Arturo Bobadilla Iunes Garcia, que atua junto à 1 ª Vara do Tribunal do Júri em Campo Grande.

Esse tipo de indenização - de forma similar às penas de privação de liberdade e de multa - tem um papel educativo, avalia o tribuno. Ademais, afirma o Promotor de Justiça: “As penas no Brasil são boas, mas o cumprimento ainda precisa melhorar. A reparação financeira pode ajudar momentaneamente as famílias a se recuperarem financeiramente", observa.

De acordo com a experiência do Promotor de Justiça, nos casos de feminicídio, as reparações têm sido significativas, variando entre 20 e 40 salários-mínimos, equivalentes a cerca de R$ 23 mil a R$ 56 mil.

“Essas indenizações são destinadas principalmente aos filhos e, em alguns casos, às mães das vítimas, que muitas vezes dependiam financeiramente da mulher assassinada”, declara.

Desafios

Apesar dos avanços nos casos de feminicídio, outras categorias de crimes dolosos contra a vida, apreciados pelo Conselho de Sentença do júri popular, ainda enfrentam dificuldades para obtenção de reparações financeiras significativas.

"É uma questão de cultura e de continuar recorrendo para que essas reparações sejam ampliadas para outros crimes", afirma o Promotor de Justiça Bobadilla.

Para ele, a presença das famílias das vítimas no plenário é um fator crucial.

"A presença da família da vítima no plenário do júri é muito importante, não só para o Ministério Público, mas também para os jurados, que podem se colocar no lugar dos familiares", destaca o promotor. Ele acredita que a participação ativa das famílias pode influenciar positivamente em relação ao convencimento dos jurados.

Ainda sobre a possibilidade de indenização pela perda da vida de um ente querido ou pelas sequelas para uma vítima de violência, o Promotor de Justiça acrescenta que a reparação determinada na ação penal não encerra o direito de buscar a esfera cível.

Podem ser movidas ações por danos morais, com solicitação de indenização e até mesmo pensão para crianças que tenham ficado órfãs de pai ou de mãe. Vale o mesmo para o cônjuge que fica viúvo ou para a mãe que perde o filho.

Essa reivindicação judicial só pode ser feita em caso de reconhecimento do crime e da culpa dos acusados.

 

Princípio constitucional

O direito à reparação por danos morais e materiais está cristalizado no inciso X do artigo 5º da Constituição Federal de 1988, aquele que rege os direitos e obrigações individuais e coletivos. 

“São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.”

 

Em relação ao Tribunal do Júri, o artigo 387 do Código de Processo Penal (CPP) - sobre o rito do juiz na hora da sentença - inclui como um dos passos a decretação de montante mínimo a ser pago pelos réus em caso de condenação. 

Diz o inciso IX do artigo citado que o juiz “fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido.”

Essa redação foi dada pela Lei nº 11.719, de 2008, quando houve uma série de modificações na lei de 1941.