A ASSOCIAÇÃO SUL-MATO-GROSSENSE DOS MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO – ASMMP, entidade de classe que congrega os Promotores e Procuradores de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul, reiterando seu absoluto respeito à liberdade de imprensa, externa o seu posicionamento a respeito da ação realizada pela Câmara dos Deputados, na madrugada do dia 30/11/2016, que manietou a vontade popular e rasgou o conteúdo original do Projeto de Lei das 10 medidas de Combate à Corrupção, o qual visava fortalecer justamente os mecanismos de combate a maior mazela existente na história do nosso país, a CORRUPÇÃO.
Em vez de atender ao pedido popular de PUNIÇÃO AOS CORRUPTOS, a Câmara dos Deputados decidiu modificar o projeto criando amarras para impedir as investigações realizadas no combate à corrupção e, mais grave ainda, criminalizando a conduta dos Promotores e Procuradores de Justiça e Magistrados que combatem a corrupção e estão conseguindo colocar atrás das grades detentores de poder político e econômico no cenário nacional e local.
Não se pode aceitar que seja definida como crime a oferta de denúncia ou ação civil se não for recebida pelo Judiciário, sob pena de se estar amordaçando o trabalho do Ministério Público. Se a ação penal fosse de per si uma condenação, o processo seria desnecessário e a condenação ocorreria diretamente com a investigação. O processo traz a oportunidade de realização de provas e do contraditório, e dele, naturalmente, haverá uma sentença, seja absolutória, seja condenatória. Não se pode imputar ao Promotor de Justiça a prática de crime se, depois de produzidas as provas, houver absolvição. O não recebimento da denúncia e a absolvição significam que uma tese prevaleceu. Não significa, porém, que houve dolo em uma ação técnica e juridicamente motivada.
As garantias constitucionais do devido processo legal e do duplo grau de jurisdição pressupõem a análise dos fatos trazidos na petição inicial por um julgador e possibilitam a reforma da decisão por Órgão Judicial Colegiado, situações em que teses jurídicas são analisadas. O mero fato do julgador discordar da tese apresentada ou do Tribunal reformar a decisão anterior JAMAIS pode ter como consectário a imputação de abuso de autoridade ao agente do Estado que entendeu diversamente.
O fato é que se está a recriar os chamados “crimes de hermenêutica”: o juiz ou o membro do Ministério Público podem ser responsabilizados, com prejuízo para as suas vidas funcionais ou mesmo para a sua liberdade, quando o seu convencimento jurídico motivado não corresponder àquele que, afinal, prevalecer. Nada mais odioso: sob tais circunstâncias, jamais teriam sido prolatadas inúmeras das decisões judiciais inovadoras em sede de direitos individuais e sociais que hoje balizam a jurisprudência nacional; não teriam sido prolatadas muitas sentenças e acórdãos de perfil contramajoritário; as súmulas e orientações jurisprudenciais não estariam se renovando, de acordo com as necessidades da população; e jamais teriam sido possíveis operações oficiais de desbaratamento de esquemas complexos de corrupção, como, p. ex., a própria Operação LavaJato.
Além do mais, todos os Membros do Ministério Público e da Magistratura estão submetidos ao império da Lei, sujeitando-se às quatro esferas de responsabilidade: civil, criminal, de improbidade administrativa e disciplinar. Ao lado do Princípio Constitucional da Reserva da Jurisdição, há rigorosos e legítimos órgãos de controle interno, como as corregedorias, e externo, como o Conselho Nacional do Ministério Público e o Conselho Nacional de Justiça.
Assim, a ASMMP expressa publicamente o apoio a todos os Membros do Ministério Público que, de forma ética, destemida e responsável, têm atuado no combate aos atos de corrupção e de improbidade administrativa, bem como nos crimes decorrentes destes atos, cujos resultados têm tido grande repercussão no âmbito nacional e local. Confia, ainda, no trabalho dos Parlamentares comprometidos com a probidade, com a ética pública e com a integridade da Instituição Ministerial e do Poder Judiciário, que, certamente, resistirão à aprovação do o chamado “PL do Abuso de Autoridade” e ao PL n. 4.850/2016, ambos no Senado Federal, naquelas seções que contrabandearam silenciosamente novos “crimes de responsabilidade” no Projeto das 10 Medidas contra a Corrupção, resgatando a odiosa “lei da mordaça” e transformando-o, a rigor, em um projeto de intimidação a Promotores e Procuradores de Justiça e Magistrados nos esforços de combate à corrupção.
Campo Grande/MS, 05 de Dezembro de 2016.
Lindomar Tiago Rodrigues
Promotor de Justiça e Presidente da Associação Sul-Mato-Grossense dos Membros do Ministério Público – ASMMP