O Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul, por meio da Promotora de Justiça Jaceguara Dantas da Silva Passos, fez recomendação em fevereiro de 2015 a todos os dirigentes de escolas particulares de Campo Grande, em todos os níveis de ensino, ao Governo do Estado de Mato Grosso do Sul e ao Chefe do Poder Executivo de Campo Grande-MS, mediante suas respectivas Secretarias de Educação, levando em consideração que a criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-lhes a igualdade de condições para o acesso e permanência na escola (artigo 53, inciso I, do Estatuto da Criança e Adolescente).

A Promotora de Justiça levou em consideração para fazer a recomendação, notícia publicada na mídia da capital de que determinada escola particular teria obstado a matrícula de aluno com deficiência bem como exigido taxa extra para contratação de ‘especialista’ para acompanhar o aluno com deficiência nas dependências da escola, atitude esta que vai de encontro aos ditames constitucionais e legais, sem prejuízo de configurar eventual prática do crime e de ato discriminatório previsto na Lei nº 4.372, de 3 de julho de 2013.

Tal fato, segundo a Promotora de Justiça, titular da 67ª Promotora de Justiça dos Direitos Humanos da comarca de Campo Grande, motiva a emissão da Recomendação visando à tutela da dignidade, igualdade e do direito à educação das pessoas com deficiência, sem preconceitos e discriminações que obstem o acesso a todos os níveis educacionais de ensino nesta Capital.

Escolas particulares

A Promotora de Justiça recomendou a todos os dirigentes de escolas particulares de Campo Grande, em todos os níveis de ensino que procedam a matrícula no ensino regular de todos os estudantes, independentemente da condição de deficiência física, sensorial ou intelectual, bem como ofertem o atendimento educacional especializado, garantindo assim acesso à educação conforme legislação, promovendo o atendimento às suas necessidades educacionais específicas segundo avaliação individual, combatendo preconceitos e criando atitudes informadas e positivas visando fornecer a este segmento de alunos a devida autonomia, interação e inclusão com demais alunos.

Recomendou que sejam entendidos como alunos com deficiência aqueles que:

Possuem impedimentos de longo prazo de natureza física, intelectual, mental ou sensorial;

Alunos com transtornos globais do desenvolvimento como variações na atenção, na concentração e, eventualmente, na coordenação motora. Aqueles que apresentam um quadro de alterações no desenvolvimento neuropsicomotor, comprometimento nas relações sociais, na comunicação ou estereotipias motoras; variações na atenção, na concentração; mudanças de humor sem causa aparente e acessos de agressividade em alguns casos, incluindo-se nessa definição alunos com Autismo Clássico, Síndrome de Asperger, Síndrome de Rett, Síndrome de Kanner Transtorno Desintegrativo da Infância (psicoses) e Transtornos Invasivos sem outra especificação, entre outras patologias (rol não taxativo);

Alunos com altas habilidades/superdotação: aqueles que apresentam um potencial elevado e grande envolvimento com as áreas do conhecimento humano, isoladas ou combinadas: intelectual, liderança, psicomotora, artes e criatividade;

Que garantam no seu Projeto Político Pedagógico a educação inclusiva e, para tanto, especifiquem em sua proposta pedagógica a flexibilização curricular, programa extensivo de orientação, metodologias de ensino, recursos didáticos e processos avaliativos diferenciados para atender as necessidades educacionais específicas dos alunos, promovendo as adaptações necessárias;

Que constem na planilha de custos da instituição todos os valores relativos à manutenção e desenvolvimento do ensino, o financiamento de serviços, recursos e profissionais da educação especial e de apoio necessários aos alunos com deficiência, abstendo-se de efetivar cobrança de taxas extras em função da deficiência, sob pena de responsabilidade penal e administrativa;

Que exijam dos responsáveis das crianças e adolescentes com deficiência, matriculados no estabelecimento de ensino, relatórios de atendimento de saúde necessários ao desenvolvimento do aluno, comunicando ao Conselho Tutelar competente situações onde seja necessária a sua atuação para a garantia do direito à saúde, bem como, casos de negligência, omissão ou outras violações ao dever de assistência previstos no artigo 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente: "Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais";

Que na existência de casos onde haja dúvidas referentes à violação de direitos das crianças e/ou adolescentes com deficiência relativos à garantia da educação inclusiva, que sejam formalmente encaminhadas ao Conselho de Educação competente, bem como efetive a devida notificação compulsória em casos de constatação de violência que vitimize o respectivo aluno com deficiência.

Ao Estado e ao Município

Ao Governo do Estado de Mato Grosso do Sul e ao Chefe do Poder Executivo de Campo Grande-MS, mediante suas respectivas Secretarias de Educação recomendou que realizem monitoramento contínuo e avaliações periódicas nas escolas particulares de Campo Grande-MS, em atuação conjunta e colaborativa, nos moldes do previsto no Plano Estadual de Educação de Mato Grosso do Sul (Lei nº 4.621/2014), a fim de garantir o cumprimento da Meta nº 4, quanto à Educação Especial para alunos com deficiência, no que se refere à universalização do acesso à educação básica e atendimento educacional especializado na rede regular de ensino, com eliminação de qualquer forma de discriminação, em especial com relação à abusiva cobrança de valores adicionais, negativa de matrícula, qualificação de professores, eliminação de barreiras físicas e demais aspectos relevantes para tanto, com a devida comunicação à 67ª Promotoria de Justiça das medidas adotadas, no prazo de 60 dias;

Realize constante apuração de atos discriminatórios à criança ou adolescente com deficiência nos estabelecimentos de ensino, creches ou similares, públicos e privados, possibilitando a aplicação de uma das sanções previstas no artigo 6º, da Lei Estadual nº 4.372, de 3 de julho de 2013, com a devida comunicação à 67ª Promotoria de Justiça das medidas adotadas, no prazo de 60 dias.

Em caso de não acatamento desta Recomendação, o Ministério Público adotará as medidas legais necessárias para assegurar a efetividade dos mencionados diplomas legais.

A Promotora de Justiça Jaceguara Dantas da Silva Passos considerou para fazer a Recomendação que os alunos com deficiência possuem o direito indisponível de acesso à educação em ambiente escolar que não seja segregado, juntamente com seus pares da mesma idade cronológica, devendo as instituições de ensino garantir meios para sua participação nas classes comuns que se beneficiem do ambiente escolar mediante uma organização administrativa e pedagógica que garanta o ensino (recursos educacionais, estratégias de apoio aos alunos, eliminação de barreiras, ajudas técnicas, entre outros), com o atendimento às diferenças entre os alunos, sem discriminações indevidas, de forma a favorecer o convívio e crescimento na diversidade.

 

Na foto, a Promotora de Justiça Jaceguara Dantas da Silva Passos