O Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF) manifestação favorável ao efeito de se considerar homofobia e transfobia como crime de racismo e determinar a aplicação do art. 20 da Lei 7.716/1989, que define penas para discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, na ausência de lei específica.

Como alternativa, o Procurador-Geral da República opina pela aplicação dos dispositivos do Projeto de Lei 122/2006, que propõe a criminalização da homofobia e transfobia, ou do Projeto de Código Penal do Senado, que prevê pena de prisão para quem praticar racismo e crimes resultantes de preconceito e discriminação, até que o Congresso Nacional edite legislação específica.

Rodrigo Janot explica que é possível aplicar a Lei 7.716/1989 (Lei de Racismo) para todas as formas de homofobia e transfobia, porque tal pedido repousa na técnica de interpretação conforme a Constituição, em que o STF poderá adotar decisão de perfil aditivo a partir da legislação existente. "Ao tempo em que se respeita a vontade manifesta do Poder Legislativo, externada em lei vigente por ele criada, concede-se interpretação extensiva, sintonizada com a realidade social."

Alternativamente, para o PGR, pode ser acolhido o pedido maior da ABGLT, para que o próprio STF regulamente os dispositivos constitucionais invocados como carentes de interposição legislativa, enquanto não seja editada lei específica pelo Congresso Nacional.

O parecer foi enviado em agravo regimental ajuizado pela Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) contra decisão desfavorável do STF no mandado de injunção (MI) 4733. Entre as possibilidades do MI, estão a fixação de prazo para o Poder Legislativo editar norma sobre o assunto ou a própria regulamentação da situação.

Segundo Rodrigo Janot, é patente a excessiva duração do processo legislativo da proposta de criminalização da homofobia e transfobia: desde o Projeto de Lei 5.003/2001, aprovado originariamente na Câmara dos Deputados, e que se configurou no PL 122/2006 do Senado, somam-se aproximadamente 13 anos de trâmite legislativo.

Para o Procurador-Geral da República, a parca legislação penal em vigor não mais dá conta da discriminação e do preconceito referentes à orientação sexual e à identidade de gênero. Ele considera importante que o STF intervenha para acelerar o processo de produção normativa e conferir concretização aos comandos constitucionais de punição de qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais e da prática do racismo como crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão. "Para tanto, cabe a fixação de prazo razoável para ultimação do processo legislativo - que a associação autora sugere que seja de um ano", diz.

Indenização

O Procurador-Geral da República não concorda com o pedido de indenização em favor de vítimas de homofobia e transfobia, com base em suposta responsabilidade civil do Estado brasileiro por omissão em criminalizar as condutas. Para ele, o mandado de injunção possui finalidade constitucional específica: a viabilização do direito constitucional obstado por falta de norma regulamentadora.

"A ação tende a provimento de cunho constitutivo ou mandamental, não de decisão condenatória. Além disso, o pedido de Mandado de Injunção via de regra não comporta indenização, a menos que fosse essa a maneira de concretizar o direito constitucional obstado por omissão, o que não é o caso", afirma ele.

Racismo persiste

Mesmo com a conquista de direitos civis, o racismo persiste em diversos níveis da sociedade brasileira e dos Estados Unidos. A opinião é da ativista, professora e filósofa norte-americana Angela Davis: "mesmo que o Brasil tenha sido proclamado uma democracia racial, há problemas sérios (de racismo), que são relacionados à economia, à sociedade e à política", disse durante o Festival Latinidades 2014: Griôs da Diáspora Negra, que terminou dia 28, em Brasília.

Na opinião de Angela, o mesmo fenômeno acontece nos Estados Unidos. "O tipo de racismo que se tem depois (da conquista de direitos civis) é mais difícil de combater que antes". Ela cita o sistema carcerário e a polícia que, em ambos os países, perpetuam a discriminação. "Como no Brasil, nos Estados Unidos a raça importa quando é para determinar quem vai para a prisão e quem vai para a universidade".

No Brasil, o Mapa da Violência 2014 mostra que as principais vítimas são jovens do sexo masculino e negros, eles representam 53,4% do total de homicídios do país. Nas universidades, há um contraste, o Censo da Educação Superior de 2012 mostra que, dos 7 milhões de estudantes, 187 mil são pretos e 746 mil pardos, o que representa 13,3% do total.

"É preciso haver uma mudança em todas as instituições racistas que temos, que nesse caso do genocídio da população negra, é a polícia", disse a escritora brasileira mineira Ana Maria Gonçalves, também presente no evento. "O governo tem que criar uma polícia mais humanitária, tem que dar cursos sobre como se lida com o racismo dentro das instituições". Ana Maria é autora do premiado romance Um Defeito de Cor.

Fonte: Com informações da Secretaria de Comunicação Social
da Procuradoria Geral da República e da Agência Brasil

Foto: Agência Brasil